quarta-feira, 13 de março de 2013

A deriva anti-democrática

Recentemente escrevi um texto chamado «Compilação incompleta de ataques à Liberdade» referindo-me à forma como as liberdades fundamentais têm vindo a ser postas em causa pela actuação do actual Governo.
Devido à política económica e social desastrosa, e às consequências imediatas e palpáveis que tem tido na vida das pessoas, poucos têm prestado atenção a estes ataques insidiosos e perigosos à Democracia.

Tal como escrevi nesse texto, a lista apresentada era incompleta. Recentemente têm surgido uma série de outros ataques, que deveriam revoltar qualquer amante da Liberdade - mesmo aqueles que concordam com esta política económica, se acreditam na Democracia e nas liberdades fundamentais, deveriam indignar-se com estas notícias e pressionar o Governo a inverter o rumo.

Começo por citar a TSF: «Demitiu-se em bloco a direção da entidade que gere a Internet em Portugal. Pedro Veiga, presidente demissionário, justifica a atitude dizendo que o Governo quer nacionalizar a Internet.»
Esta situação é extremamente preocupante. À maior concentração dos meios de comunicação social em menos mãos (consequência de legislação que o permitiu), os portugueses estão a recorrer cada vez à Internet em alternativa aos meios de comunicação social tradicionais.
Mesmo que o trabalho jornalístico acabe por frequentemente surgir dos mesmos meios, a componente «editorial» de decidir o que merece mais ou menos relevante, quer ao nível das notícias, quer ao nível da opinião, tem saído do controlo de uma (cada vez menor) minoria e passado a depender das decisões colectivas dos frequentadores das redes sociais. A essa dinâmica livre das pessoas, os poderes instituídos têm respondido com legislação perigosa, que os cidadãos têm repetidamente rejeitado. À SOPA, PIPA, ACTA têm-se seguido outras tentativas de cercear a liberdade na Internet, tais como a CISPA. Em Portugal, temos isto.

Justificados também são os receios em relação às propostas do Governo quanto à video-vigilância. O constitucionalista Guilherme da Fonseca chega mesmo a considerar inconstitucionais as propostas em causa.

Por outro lado, quando mencionei «a relação problemática que este Governo mantém com a Liberdade de imprensa» fundamentando essa avaliação com vários exemplos, não podia saber que o «Sindicato dos Jornalistas (SJ) considera que a proibição de cobertura jornalística da conferência “Pensar o futuro – um Estado para a sociedade”, que se realiza hoje e amanhã em Lisboa, promovida pelo primeiro-ministro, é um atentado à liberdade de imprensa, pelo que vai apresentar queixa ao Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.». Nem podia saber que «A busca da PJ à residência do jornalista que investiga o crime organizado em Portugal não teve a presença de um juiz de instrução como determina o Estatuto do Jornalista.».

E, já que falamos em irregularidades deste tipo, vale a pena ver esta notícia. Também sobre a actuação da PSP (e das ordens que tem tido), é fundamental lembrar os «Seis alunos de uma escola de Braga feridos em confrontos com a PSP» numa resposta perfeitamente desproporcional, com evidente excesso de violência.
Por outro lado, quando a mesma PSP identificou manifestantes que cantaram Grândola, Vila Morena a Paulo Macedo, fê-lo sem esclarecer «qual é o crime que estariam a cometer e pelo qual foram identificados», ao contrário do que a lei estabelece. Na verdade, o mesmo episódio repetiu-se: segundo o Expresso, a «PSP não larga os "Que se lixe a troika"». Note-se que não está em causa a actuação dos agentes da PSP, alguns claramente contrariados por estarem a fazer este tipo de trabalho em vez de combater o crime como lhes compete, mas a instrumentalização que tem sido feita da PSP como forma de atacar a Democracia.

É por causa desta instrumentalização que tenho receios fundados em relação a esta notícia: «A GNR quer contar com maior apoio dos cidadãos e por isso foram formadas cerca de 1700 pessoas para servirem de elo de ligação com esta força policial. Através do Programa Interlocutor Local de Segurança, a GNR espera que estas pessoas possam melhorar a relação das populações com a Guarda, em especial no que se refere a ações de sensibilização e prevenção». Merece particular atenção o seguinte: «estas pessoas podem também fornecer às forças policiais informação privilegiada sobre o que se passa nas comunidades.»
A ideia, em princípio, poderia não ser má, e a noção de que estariam a ser pagos «bufos» como no regime anterior ao 25 de Abril poderia ser fruto de um tabu desenquadrado de tempos que já não voltam atrás. Mas, como mostrei nas notícias acima, não é o caso. Este Governo não hesita em instrumentalizar as forças de segurança para atacar as liberdades fundamentais de forma ilegal, e a decisão de, em clima de crise, pagar a estas pessoas para dar «informação privilegiada sobre o que se passa nas comunidades» é muito perturbadora.

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