quarta-feira, 23 de julho de 2008

Joseph Stiglitz: «Será o fim do neoliberalismo?»

«O mundo não tem poupado o neo-liberalismo, esse amálgama de ideias que tem por base a noção fundamentalista de que os mercados se auto-corrigem, aplicam recursos de forma eficiente e servem devidamente os interesses do público. Foi este fundamentalismo de mercado que esteve na génese do “thatcherismo”, da “reaganomics” e do chamado “Consenso de Washington”, que privilegiou a privatização, a liberalização e os bancos centrais independentes focalizados apenas na inflação.

Os países em desenvolvimento têm-se digladiado entre si nos últimos 25 anos e o resultado dessa luta é hoje claro. Os países que adoptaram políticas neo-liberais são os grandes derrotados. E por duas razões. Primeiro, não souberam tirar partido do crescimento. Segundo, quando cresceram de facto, os benefícios ficaram essencialmente nas mãos dos que ocupam o topo da pirâmide.

Por muito que os neo-liberais não queiram admiti-lo, a verdade é que a sua ideologia chumbou ainda noutro teste. Ninguém pode dizer que os mercados financeiros tenham feito um excelente trabalho no final da década de 90. Mas produziu, apesar de tudo, alguns efeitos positivos, como a descida dos custos de comunicação, que resultou numa maior integração da China e da Índia na economia global.
(...)
Os defensores do fundamentalismo de mercado querem agora que os erros do mercado sejam vistos como erros de governo. Um delegado do governo chinês colocou o dedo na ferida: os EUA deviam ter feito mais para ajudar os norte-americanos com rendimentos mais baixos a gerir melhor o problema do crédito hipotecário à habitação. Estou plenamente de acordo, mas isso não altera os factos: os bancos norte-americanos geriram especialmente mal o risco e essa má gestão tem consequências globais. Mas a injustiça é ainda maior quando se sabe que, apesar dos erros, os gestores dessas instituições saíram airosamente e com indemnizações milionárias.

Actualmente, existe uma grande disparidade entre os retornos sociais e os retornos privados. Se não forem alinhados, o sistema de mercado nunca poderá funcionar bem. O neo-liberalismo foi sempre uma doutrina política ao serviço de certos interesses e nunca se fundamentou em teorias económicas. (...)» (Joseph Stiglitz no Diário Económico)

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