quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

O bom ditador

  • «Pervez Musharraf embarked on a new five-year term as a civilian president Thursday, promising to lift a state of emergency by Dec. 16 and restore the constitution before January elections (...) But having purged the Supreme Court of judges who might have blocked his plan to continue as president, the U.S.-backed leader has moved quickly to ease a wave of repression that saw thousands of opponents jailed and all independent news channels gagged. The inauguration ceremony came a day after he ended a four-decade military career as part of his long-delayed pledge not to serve as both president and army chief. The post enabled him to topple Sharif in a 1999 coup and hold on to power for [eight] years. (...) "This is a milestone in the transition of Pakistan to the complete essence of democracy," Musharraf told an audience of government officials (...) During his inaugural speech, Musharraf sought to justify the state of emergency, during which he purged the Supreme Court just as it was about to issue a verdict on the legality of his continued rule. The retooled court last week gave its stamp of approval. (...) "I personally feel that there is an unrealistic and maybe an impractical or impracticable obsession with your form of democracy, with your form of human rights, civil liberties," Musharraf said, claiming to speak for developing countries everywhere. (...) "We will do it our way as we understand our society, our environment better than anyone in the West," he said.» (Yahoo News)

Convém não esquecer que o Paquistão é um dos dois Estados centrais do terrorismo islamista (o outro é a Arábia Saudita), serve de base (territorial e de recrutamento) à Al-Qaeda e aliados, tem a bomba nuclear, 170 milhões de habitantes, as instituições de ensino dominadas por diversas facções islamistas, tradição de tutela sobre o Afeganistão, e hostilidade hereditária com a Índia. O presidente Musharraf, no poder desde o golpe militar de 1999, tem ainda a característica deliciosa de mudar a Constituição por decreto, a seguir ao jantar:

  • «Late Wednesday, Musharraf decreed new amendments to the constitution using powers he said he has under the emergency. One of the amendments states that his decisions cannot be challenged by any court and will be considered "always to have been validly made."» (Yahoo News)

Portanto está protegido quanto à sua declaração de estado de emergência, que era inconstitucional antes do jantar. Com um dos líderes da oposição (Sharif) a só entrar no país quando Musharraf deixa (em Setembro mandou os seus homens ao aeroporto deportá-lo, contrariando uma decisão do Supremo Tribunal, agora permitiu-lhe voltar), e com a outra líder oposicionista em detenção domiciliária (Bhutto), Musharraf tem o caminho desimpedido. Tem invocado o extremismo islamista como desculpa para todas estas medidas de excepção, mas ter confrontado políticos não islamistas como Sharif e Bhutto, em vez de procurar trabalhar com eles, não é propriamente um sinal de que projecte um futuro democrático ou minimamente plural (segundo as últimas notícias, impediu Sharif de concorrer às eleições). Não esqueçamos que foi a clique militares/ISIS que apoia Musharraf que planeou, armou e financiou a conquista do Afeganistão pelos Talibã.

Na minha ingenuidade, sempre pensei que um tipo que subiu ao poder através de um golpe de Estado militar, altera a Constituição por decreto, demite juízes do Tribunal Supremo quando não lhe agradam, fecha sistematicamente os jornais da oposição, dispersa manifestações à bala e prende estudantes, mantém fora do país os líderes da oposição, impede-os de concorrer a eleições, e só permite que se vote nestas condições, fosse considerado um ditador. No entanto, parece que quem preocupa os portugas é Chávez. Portanto, desculpai a interrupção. Voltem lá ao Chávez. Esse é que é mesmo um ditador dos maus. Pelo menos, segundo a actual definição ideologicamente orientada de «ditador»: retórica anti-americana, políticas sociais social-democratas, e eleições regulares.

2 comentários :

dorean paxorales disse...

O contrário também se aplica: ninguém parece muito preocupado em por em causa que Pervez é um ditador ou sequer glorificar tão triste personagem.

Ricardo Alves disse...

E alguém glorifica o Chávez?!