terça-feira, 30 de outubro de 2007

É o quê?

«No Blasfémias, o João Miranda escreveu:

«O ensino privado e o ensino público competem com armas desiguais. O ensino público tem os seus custos de funcionamento e de investimento pagos pelo Estado. O ensino privado tem que pagar os custos de investimento e de funcionamento com as receitas que consegue atrair. O ensino público tem preço zero para o cliente, o ensino privado cobra propinas ao cliente.
Tendo em conta a total desigualdade de armas, é notável que algumas escolas privadas consigam aparecer no topo dos rankings.»


A ideia é que o ensino privado é tão mais eficiente que mesmo sem o financiamento público consegue ter resultados melhores. E é verdade que o sector privado é mais eficiente. Mas importa ver em quê.

O sector privado é mais eficiente a dar dinheiro aos donos. É para isto que o sector privado serve. Todas as empresas privadas visam produzir um só produto: o lucro para os accionistas. O resto é acidental. A bolacha, o automóvel, a operação plástica ou a média de 13 no exame nacional são meros efeitos secundários do processo de gerar lucro.

A privatização é uma boa ideia quando o objectivo coincide com a maximização do lucro. Se o objectivo é educar os filhos dos ricos o ensino privado garante a qualidade de educação que optimiza o lucro. Quanto mais ricos os pais melhor será este efeito secundário da produção de dividendos, e temos a garantia que os dividendos serão gerados com eficiência. Se não, fecha-se a escola, monta-se um centro comercial e os miúdos que vão estudar para casa.

Mas se o objectivo é garantir que todos tenham acesso à educação a situação é diferente. O sector privado é notoriamente ineficiente a prestar serviços a quem não os pode pagar.»

Nota: aproveitando a política de ausência de direitos reservados ( ;) ), este texto é descaradamente copiado do blogue Que Treta!.

11 comentários :

João Moutinho disse...

João Vasco,
Considerar que o único objectivo do ensino privado é gerar lucro é tão razoável como considerar que os professores do público não estão interessados em ensinar os seus alunos porque não lhes altera a carreira ou o respectivo ordenado.
Ainda bem que se têm estabelecido rankings, caso contrário as desigualdades manter-se-iam ocultas e não seria reconhecido o mérioto a quem merece.
Se o privado ensina melhor, então que o estado possibilite a quem é pobre desenvolver as suas capacidades nas melhores escolas.
Fico com a ideia que o nívelamento por baixo tem-nos dado muitos amargos de boca.

João Vasco disse...

joão moutinho:

«Se o privado ensina melhor» mas não ensina. Os rankings mostraram que ensina melhor e pior, e a média não tem diferenças significativas.
Isto quer dizer que privatizar o ensiono seria uma péssima opção. Em primeiro lugar para os mais pobres, e em segundo lugar para todos.

Ludwig Krippahl disse...

João Moutinho,

Uma pessoa escolhe a profissão pelo dinheiro e pelo que gosta de fazer. E quanto mais sorte tiver mais o segundo factor pesará.

E é possível que uma pessoa monte um negócio pela mesma razão. Porque gosta mais pelo lucro.

Mas quando o negócio envolve vários sócios isso é praticamente impossível, porque a medida comum do sucesso terá sempre que ser os dividendos. Nunca a assembleia de accionistas vai decidir que apesar daquilo dar mais dinheiro vamos fazer isto porque tem mais graça.

E se algum dia isso for regra geral o sector privado deixa de ser mais eficiente que o público, porque a eficiência deixa de importar.

Anónimo disse...

"Mas quando o negócio envolve vários sócios isso é praticamente impossível, porque a medida comum do sucesso terá sempre que ser os dividendos. Nunca a assembleia de accionistas vai decidir que apesar daquilo dar mais dinheiro vamos fazer isto porque tem mais graça.
E se algum dia isso for regra geral o sector privado deixa de ser mais eficiente que o público, porque a eficiência deixa de importar."


Não sei é que dividendos é que uma escola vai ter para distribuir se os potenciais clientes acharem que não vale a pena comprar o serviço.

André Carapinha disse...

«Não sei é que dividendos é que uma escola vai ter para distribuir se os potenciais clientes acharem que não vale a pena comprar o serviço.»

Um ensino generalizadamente privado funciona como um oligopólio, não gerando verdadeira concorrência, uma vez que o ensino, tal com a água, a luz, etc., são bens que não se podem dispensar.

Pelo que "os potenciais clientes" ver-se-iam, como acontece, aliás, na generalidade dos serviços prestados por privados, divididos em dois grupos: os que podem escolher, que poderão assim exigir resultados do "produto" que escolheram; e os restantes que, pela ausência de escolha, não terão possibilidade de fazer quaisquer exigências.

Isto é facil de entender. Por exemplo: os restaurantes. Aqueles que tem capacidade económica podem escolher entre restaurantes caros e baratos; mas os outros, limitam-se a ter de optar entre o leque de restaurantes baratos. Os caros estão fora do seu alcance. A sua escolha é limitada. A diferença é que ninguém é obrigado a comer no restaurante, e assim os restaurantes tem também de competir com a comida feita em casa, necessariamente mais barata, o que os obriga a apresentar um produto com o mínimo de qualidade.

Ora, com a escola, como se entende, o opção "não frequentar" não é viável.

E no entanto esta nem sequer é a minha maior objecção. Apenas quero sublinhar como os "liberais" esquecem-se sempre de que certas "escolhas", tendo um carácter obrigatório, não são escolhas nenhumas.

Tárique disse...

Não sei é que dividendos é que uma escola vai ter para distribuir se os potenciais clientes acharem que não vale a pena comprar o serviço.

Como analisas essa afirmação face ao leque de escolas secundárias à escolha em Figueira de Castelo Rodrigo (a pior no ranking) ...

ou ao cheque-ensino os liberais também querem acrescentar um cheque-deslocação-para-Lisboa ?

Sugiro o seguinte exercício: retire-se das tabelas a média das escolas onde os privados NUNCA iriam concorrer (podemos começar por mogadouro) e verifique-se agora a média das restantes escolas públicas contra as privadas. os 0.4/20 valores que a média das privadas tinha de vantagem vão-se , não é ?

Gaspar LDVS disse...

Sobre a liberdade de transmitir informação:

" quando o custo de reprodução de um determinado item se aproxima do zero, a tendencia natural das pessoas é partilha-lo"

Filipe Castro disse...

O João Vasco esqueceu-se de referir um pormenor importante nesta história: as instuiçoes privadas querem substituir as públicas, mas COM subsídios do estado, que aqui se chamam 'vouchers' e aí não sei como é que se chamam. O esquema não tem nada a ver com eficiência nem com qualquer outra coisa, é roubo organizado.

Ricardo Alves disse...

Eu concordo com quase tudo o que dizem, mas cuidado com um pressuposto errado: o ensino privado, ao contrário do que apregoam os Joões Miranda deste mundo, não é pago a 100 % por privados. Já recebe subsídios do Estado, e por vezes bem significativos no orçamento geral.

Ricardo Alves disse...

Para comprovarem o que eu digo:

http://esquerda-republicana.blogspot.com/2007/07/escola-privada-vive-do-errio-pblico.html

Ricardo Alves disse...

Ou, ainda melhor, este texto do Igor Caldeira:

http://blog.liberal-social.org/por-que-sou-contra-o-cheque-ensino