sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Manuel Alegre: do bom ao péssimo

Manuel Alegre consegue frequentemente juntar o bom e o péssimo. Na apresentação do livro do cidadão Duarte, o bom foi a maneira clara como se distanciou do europeísmo ingénuo e idealista que tem servido para nos amarrar a prioridades estratégicas e económicas que não são definidas por nós, e que portanto raramente serão as nossas:
E o péssimo foi isto:
Que Manuel Alegre seja amigo do Duarte Nuno(*), é lá com ele; que rejeite o sectarismo, acho muito bem. Agora, o que é chocante é que não compreenda que não se referenda a República como não se referenda a democracia ou os direitos individuais dos cidadãos: colocar em referendo a República seria permitir que uma qualquer família passasse a ter privilégios de linhagem e direitos de governação hereditários.
Mário Soares nunca se diz laico sem acrescentar na mesma frase que «respeita muito» a ICAR. Manuel Alegre fala em «valores republicanos», e minutos depois quer referendá-los. Desgraçada República esta...
(*) Na caixa de comentários, o Dorean Paxorales garante-me que a pessoa em causa se chama Duarte Pio. Fica a correcção.

19 comentários :

dorean paxorales disse...

Ó injúria, ó inclemência!

Por falar nisso, o homem não se chama Duarte Nuno (isso era o pai) mas sim Duarte Pio. Daí a alcunha dos tempos no ISA: "Pio-piu". Até podes aproveitar para fazer umas piadas...

Ricardo Alves disse...

Dorean,
já corrigi.
Então a alcunha dele será «Dom Pio-Piu»? É isso?

João Moutinho disse...

Ricardo Alves,
Não queria acreditar no que vi que escreveu sobre a sua proposta de referendar a República, e as comparações que empregou.
Receio estar num patamar, em termos de tolerância, semelhante a quem "não discute a pátria, não dicute a família,..." e tudo o resto que já sabemos.
A República foi instalada com uma revolta aramada já era mais do que tempo do que ser sufragada.

Ricardo Alves disse...

João Moutinho,
a República para mim é inseparável da não discriminação por razões de ascendência, de religião, ou de «etnia». E isso não se referenda?
(Ou será que se referenda? E nesse caso pode imaginar-se um referendo sobre se a igreja católica deve ser a igreja de Estado, sobre se os ciganos devem ser cidadãos, sobre se os não católicos podem ter direotos iguais, etc.)
Quanto à questão histórica, é verdade que a República foi proclamada após uma revolta armada. Mas o 25 de Abril também. E no primeiro caso foi o povo em armas que fez o novo regime, não foi uma parte (embora muito expressiva das Forças Armadas). Há muita gente que não sabe disto, e outros que preferem tergiversar.

dorean paxorales disse...

E pronto, fala-se no cinco do dez e ja' esta' o caldo entornado...
Tergiversando, essa discriminacao de que falas incomoda muito menos que os favorecimentos da praxe 'as familias de presidentes. Pelo menos tem um destino certo e esta' oficializada porque corresponde 'a funcao; a 'republicana' e' hipocrita e dada a caprichos amiguistas, sem qualquer proveito para os discriminados.

Ricardo Alves disse...

Dorean,
isso é falso. Incomodava, e muito.

E não sei a que favorecimentos às famílias dos presidentes te referes. Podes ser mais explícito?

João Moutinho disse...

Ricardo Alves,
O referendo, quanto a mim, seria a melhor forma de legitimação da República.
E não nos esqueçamos que as presentes monarquias europeias ou nipónica existem em Estados que se podem orgulhar de ser dos mais equalitários em termos de distribuição de riqueza e de liberdade.
Além de que uma coisa é referendar a Democracia e outra é a sua forma de expressão.
Não me parece que alguém queira cá o D. Miguel.

Ricardo Alves disse...

João Moutinho,
queres referendar a democracia também? Há coisas que não se referendam.
Quanto às monarquias europeias, há algumas sem nada de igualitário. Por exemplo, o Reino Unido.

dorean paxorales disse...

Ricardo, isso é falso, não incomodava nada. E podíamos passar aqui o dia.

A tua pergunta não fica sem resposta; difícil é escolher o melhor exemplo de nepotismo.

Ficam assim os mais recentes: Vera RiTTa DE Sampaio e irmão, recém-licenciados admitidos no início deste ano respectivamente como “Adjunta do Gabinte do Ministro da Presidência” (despacho n.º 13 299/2006), e como “consultor” da Caixa Geral de Depósitos.

Isto no que é patente ao público.

Milo Manara disse...

Dois apontamentos:

Dizer que os estados das actuais monarquias constitucionais são todos ricos e têm uma sociedade civilizada porque são monarquias é um argumento falacioso ou, para quem acreditar mesmo nele, muito pouco inteligente (caso da mulher do Duarte Pio).

Por serem ricos e por sempre terem tido sociedades menos desiguais precisaram menos de fazer roturas, permitindo que um sistema medieval chegasse ao seculo XXI, tornando-o meramente decorativo. Só isso.

Quanto aos filhos do Sampaio, o que o Dorean faz é o que se chama vulgarmente calúnia. Deitar abaixo por deitar abaixo.Sabe por acaso se os referidos filhos do ex-presidente têm qualificações para exercer os cargos que exercem? Por acaso têm, mas isso não interessa quando se quer dizer mal, não é? Se o facto de pai ser quem é ajudou? Claro que sim, mas as coisas funcionam assim em Portugal e em todo o mundo. Nas monarquias também, como é óbvio.

Ricardo Alves disse...

Dorean Paxorales,
o Milo Manara tem razão. Por A e B serem filhos de um ex-presidente isso significa que ficam proibidos de exercer qualquer cargo numa instituição pública?!
Perdem direitos cívicos por serem filhos de quem são?!
Isso sim, é um raciocínio genuinamente monárquico.
Quanto à situação anterior à República, deves estar informado de que havia uma religião de Estado, certo? E de que as outras estavam na clandestinidade, certo? Ou isso não conta?
Ou não me digas que preferirias uma situação como a do RU, em que ainda hoje os bispos anglicanos têm assento na Câmara dos Lordes, existe uma lei contra a blasfémia (que ainda mandou pessoas para a prisão há vinte e poucos anos), e a família real está acima da crítica (e da lei, e dos impostos)?

dorean paxorales disse...

Ricardo,

Começando por baixo: não tenho a família real inglesa como modelo e a lei que a coloca ao abrigo de impostos é do tempo da segunda guerra e não um privilégio medieval; o parlamento eleito pelo povo pode mudá-la quando quiser. O resto é rama e não há falta de crítica na imprensa britânica para quem a quiser ler/ouvir. Estás a confundir o Speaker's corner com a floresta.

Quanto à rábula das religiões do Estado ou da clandestinidade em 1910, tanto se me dá: fala do presente, que é onde vivemos, e onde sem monarquia nem religião de Estado aparentes ainda não há república que te valha.

Não disse que os rebentos de Sampaio deveriam estar condenados ao desemprego; mas é muita ingenuidade julgar que a nota final de curso de um recém-licenciado fosse justificação que baste para que a República criasse e sustentasse os postos de trabalho em causa. Não passou de privilégio concedido a quem é filho de quem é.
Em piores moldes esteve quem, nos tempos de Soares, se atreveu a candidatar à presidência da Cruz Vermelha Portuguesa, ocupada na altura pela sra.Maria Barroso, actriz, por ser mulher de quem é.

Só é cego quem não quer vêr.

Caro Milo Manara, concordo em absoluto com os seus primeiros parágrafos: uma monarquia constitucional não torna uma sociedade mais desenvolvida ou 'menos desigual'; claro está que, aparentemente, também não a impede.

Quanto ao preconceito, à 'calúnia' gratuita e ao 'deitar abaixo por deitar abaixo', parece-me que é o que começa por fazer logo no início com a deselegância dirigida a pessoa terceira. Para moralista, falta-lhe autoridade.

Milo Manara disse...

Moralista eu? Essa agora...foi coisa que nunca fui. Já deselegante costumo ser.

Sem querer aprofundar muito a questão, até porque não sou Advogado de defesa, nem sequer amigo dos visados, a filha do Sampaio não e recem-licenciada. Formou-se há uns bons 6 ou 7 anos. Mas isso é pormenor que dirá não tirar força aos seus argumentos. O problema é que esse mito dos filhos do Sampaio terem tachos das arábias começou com o email anónimo, semi-analfabeto e mentiroso de um palerma qualquer. A essas coisas não de deve dar credibilidade.

A Republica não criou os empregos para serem ocupados pelos meninos do ex-Presidente. É evidente que quem decidiu se lembrou dos filhos do amigo. E quanto mais influentes são os amigos, melhores empregos se conseguem. Mas isso não tem nada a ver com a Republica...

Milo Manara disse...

Mas já agora explico melhor "a deselegância" deixada à mulher do Duarte Pio.

Ela defendeu esse argumento de "a monarquia é melhor, basta ver que as monarquias são paises mais ricos". Eu ouvi. Foi no 5 de Outubro enquanto o régio casal andava de barco com um ar pesaroso.

Anónimo disse...

O respeito pelo passado de Manuel Alegre tem-me levado a abster-me de comentar este post e o seu comportamento.

Mas pode ficar-se indiferente perante a promoção de uma figura menor - o Sr. Duarte Pio - e a perda da ética republicana por quem tem sido uma referência cívica?

E mais não digo. Gosto demasido de Manuel Alegre.

dorean paxorales disse...

Milo Manara disse:

"(...) Formou-se há uns bons 6 ou 7 anos. Mas isso é pormenor que dirá não tirar força aos seus argumentos."

Pois não. Mas agradeço a rectificação.

"A Republica não criou os empregos para serem ocupados pelos meninos do ex-Presidente.
É evidente que quem decidiu se lembrou dos filhos do amigo. (...) Mas isso não tem nada a ver com a Republica..."

Se calhar são amigos monárquicos. À falta de rei, 'realizam' a família presidencial.

João Moutinho disse...

No entanto, penso que a questão do se deve manter sobre o referendo, até porque o povo se deveria rever como soberano.
Mas a nossa participação em refendos deixa a muito desejar, se calhar preferimos que o D. Sebastião (mesmo republicano) venha tomar conta de nós - e taxe forte nos deficientes.

Anónimo disse...

Há em alguns destes comentários uma confusão entre democracia e república. Manuel Alegre fez o mesmo que os grandes Oliveira Martins, António Sérgio que disseram que a democracia e o socialismo é mais importante que a questão do regime. E por isso eram monárquicos Á sua maneira. Vejam lá quem estava na Comissão do humberto Delgado... E acho que não sabem que os fundadores do Partido Socialista Achiles Monteverde defendeu D. MAnuel II
Não sabia disso dos filhos do dr.Sampaio mas claro que é nepotismo porque são cargos sem concurso público. São os novos privilegiados, os fidalgos da república.

Anónimo disse...

Tanta hipocrisia junta neste blog. O Estado Novo impôs durante 48 uma ditadura que era anti-democrata e acima de tudo Republicana.
Aliás vocês dizem-se democratas ? quantas diópetrias têm nos óculos ? Afinal este regime numa foi votado pelo Povo Português como podem dizer que isso é ser democrata ? É precisamente isso que Manuel Alegre !!!
Podem ter a certeza de uma coisa os monárquicos nunca tiveram nada a ver com Salazar e a Ditadura mas os republicanos têm culpa no cartório até à ponta dos cabelos.
Quando se fizer um referendo aí podem dizer que vivemos numa democracia Plena.