quinta-feira, 28 de abril de 2005

A vitória de Bush

Na última New York Review of Books encontra-se um artigo que despeja alguma luz sobre a vitória de George W. Bush nas eleições presidenciais dos EUA.
O autor do artigo argumenta que os Republicanos triunfaram por conseguirem pintar-se como o partido das classes populares, usando o mesmo pincel para esborratarem os Democratas como aristocratas elitistas desligados das «pessoas comuns». Esta operação, que inverteu com sucesso as posições tradicionais da «luta de classes», utilizou sobretudo as posições «liberais» (reais ou presumidas) dos Democratas em assuntos de «valores» como o casamento de pessoas do mesmo sexo, o aborto ou o direito à morte digna, para os afastar do eleitorado mais pobre e rural, que foi mobilizado com êxito pelos fanáticos religiosos e pelos demagogos radiofónicos da direita. Tendo decidido aproximar-se do chão do meio em questões económicas, os Democratas desguarneceram portanto a outra frente de batalha onde poderiam cativar os eleitores que serão mais prejudicados pelo desmantelamento do Estado de bem-estar e pela descida dos impostos dos mais ricos.
A conclusão (irónica) do artigo é que as guerras de «valores» que serviram para vencer no dia da eleição foram meramente oportunistas. Na realidade, os casamentos homossexuais já eram ilegais na maior parte dos Estados. E a tentativa de George W. de impedir o desenlace do caso Terri Schiavo foi conscientemente fútil.
Assistimos a uma orquestração semelhante em Portugal, nas últimas eleições legislativas. Santana Lopes, de forma desastrada, tentou provocar um sobressalto conservador, que falhou por dois motivos principais. Primeiro motivo, faltou-lhe uma rede de fanáticos de aldeia que pudessem assustar as velhotas beatas com fantasmas como a proibição da Bíblia ou o aborto no nono mês (o que aconteceu nos EUA através da rede de igrejas evangélicas). A ICAR não esteve disponível para este trabalho. Segundo motivo, o PS é, nas mentes populares, um partido conservador moderado. Esta avaliação, do meu ponto de vista, é politicamente correcta. No fim do dia eleitoral, Santana Lopes não podia evitar a derrota.
(Todos os anglicismos usados neste texto foram escritos em consciência.)

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